quinta-feira, 8 de março de 2012

Dízimo - DOM DE DEUS E SERVIÇO AO REINO

A palavra “dízimo” significa décima parte.  Presente em outras tradições e culturas, chegou-nos através de inúmeras citações do Antigo Testamento, que atestam sua prática entre os israelitas. No tempo das doze tribos de Israel, a tribo de Levi  servia ao altar e era pobre, desprovida de rebanhos e campos para cultivar. Devia ser sustentada pelas outras onze tribos que separavam uma parte de suas colheitas e de seu rebanho e entregavam aos levitas, bem como aos estrangeiros, aos órfãos e às viúvas. O livro do Deuteronômio refere-se a dois tipos de dízimo (Cf. Dt 14, 22-28): um anual e outro trienal. Ano a ano, a décima parte devia ser tomada dos produtos agrícolas e trazida ao Templo para o banquete sagrado. A cada três anos era deixada nas portas para alimentar os pobres.
“Pagar ou não pagar” o dízimo é questão que aflige a uma parcela considerável de católicos. Alguns resistem a participar da pastoral do dízimo em suas comunidades alegando, entre outras coisas,  a legendária “riqueza” da Igreja. São católicos até participantes. Têm, contudo, uma idéia antiga de Igreja, considerando-a  mera provedora de bens espirituais, não precisando, portanto, de recursos para se manter. O dízimo perdeu a sua força na Igreja católica aqui no Brasil, porque até a Proclamação da República, os dízimos eram cobrados pelo estado e este os repassava à Igreja. Como era um imposto e tinha uma administração falha, perdeu a sua credibilidade e gerou um certo preconceito no meio católico, que perdura até os dias atuais.
A entrega do dízimo não é pagamento. Nenhum cristão “deve” dízimo à Igreja. Ao trazer mensalmente seu dízimo, o fiel não está pagando pelo serviço religioso do qual usufrui. Nem o faz com interesses pessoais, para ganhar bênçãos e assim multiplicar sua renda ou reserva para si um lugar no céu. A idéia de que Deus recompensa nosso dízimo com riquezas é uma afronta à palavra divina. Quem dá esmolas para ficar rico, não dá nada: está fazendo comércio. Quem doa, não espera nada em troca.
Há uma mística a se resgatar no gesto da entrega do dízimo: Deus é generoso e clemente. Tudo lhe pertence. Em sua misericórdia criou o mundo e tudo que existe para o bem do ser humano. Ele concede dons, talentos, inspiração, capacidade de criar e trabalhar a todos os viventes. Quem produz algo, o faz porque o Senhor o permite. Revela-se assim o dízimo como um gesto de gratidão para com Aquele a quem tudo devemos.  
O dinheiro oferecido de acordo com as posses e consciência de cada um é humilde reconhecimento de que sem Deus nada se é, nada se tem. Mas Deus não precisa de dinheiro, poder-se-ia contra-argumentar. Mas os pobres, seus ministros e a comunidade necessitam se manter. Vê-se aí o dízimo numa dimensão de partilha e solidariedade. Deus se identifica com as necessidades dos pobres e da comunidade. A subsistência da Igreja sempre dependeu da colaboração dos fiéis.
A Igreja Católica não obriga seus fiéis a contribuir com o dízimo. Também não os obriga a doar o valor que corresponde ao sentido da própria palavra: décima parte. São Paulo esclarece em sua segunda carta aos cristãos de Corinto: "Que cada um dê conforme tiver decidido em seu coração, sem pesar nem constrangimento, pois “Deus ama quem dá com alegria” (II Cor 9,7). Há os que doam mais que a décima parte e os que doam bem menos. A quantia em si mesma não importa. Entregar o dízimo não é garantia de salvação. Quem entrega o dízimo não pode se considerar melhor cristão. Por outro lado, embora a palavra dízimo tenha o significado de dez por cento, décima parte, São Paulo nos ensina que a nossa contribuição não necessita se basear num percentual rígido, o critério para definir o valor do dízimo é o impulso do nosso coração. Devemos contribuir com o máximo que o nosso orçamento possa suportar. Assim, quem pode dar 10% não contribua com menos. Quem puder dar 5% não dê 4, quem puder dar 3% não dê 2. "Dê cada um conforme o impulso de seu coração sem tristeza nem constrangimento, pois Deus ama a quem dá com alegria", ibidem.
Proliferam atualmente seitas cujo único objetivo parece ser explorar a boa-fé de pessoas carentes e desesperadas. Com promessas de curas e de progresso material realizam campanhas alardeando libertação para todos os tipos de males. Usam o nome de Deus em vão a todo o momento. “Em nome do Senhor Jesus” é a senha pela qual encantam os que buscam soluções imediatas para seus problemas. Os métodos usados nestes empreendimentos religiosos são refinados e bem articulados. Não atacam diretamente as contas bancárias dos fiéis, mas cuidam de seduzi-los aos poucos. As pessoas se entusiasmam com o horizonte de prosperidade que lhes é anunciado. Muitas vezes se privam do essencial para não deixar de contribuir com o funcionamento destas novas seitas. Esta constatação não macula o sentido e a importância do dízimo em suas raízes bíblicas, teológicas e eclesiais. Não podemos confundir, contanto, a oferta espontânea do dízimo com exploração financeira.

 Pe. Antonio Damásio Rêgo Filho

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