José
é o nome dele. Menino como tantos outros. Pés descalços, atônito, nunca
vira a cidade tão apinhada. É o empurra-empurra das compras de Natal.
Mal consegue caminhar. Nas vitrinas, nas ruas, nas lojas, papai Noel,
obeso, roupa e gorro vermelhos, botas e cinto pretos, barbas brancas, às
vezes, com um sininho à mão, mas sempre prometendo brinquedos e
presentes às crianças, tirando com elas muitas fotos.
Lembra-se,
em criança, de papai Noel, chegando de caminhão. Sim, num enorme
caminhão, perto de casa, onde dezenas ou centenas de meninos e meninas
recebiam brinquedos e os pais uma cesta básica.
É
Natal, tempo de alegria. Tempo de generosidade. Tempo de bondade. Tempo
de caridade. Caridade, não, a professora Lia detesta essa palavra. Nas
aulas, ensina que caridade é sujeição, subordinação, e todos somos
sujeitos de direito. Temos direito às coisas e não necessitamos de
esmolas. José, no entanto, caminha, sem direito a comprar presentes, um
presentinho sequer. Seu coração é tão grande: daria pra dar um presentinho pra cada criança pobre, pra cada idoso.
Gostaria de ajudar as pessoas, mas é tão pobre...ajudar seu pai,
desempregado, sua irmãzinha... Mas agora, aos doze anos, não iria pedir,
como tantas vezes pediu, em vão, tantas coisas a papai Noel. –Pedir a
papai Noel, nunca!-- Dizia doutor Alcides, advogado e amigo de seu pai.
Será que tudo isso que via é aquilo que doutor Alcides tanto criticava: a terrível sociedade de consumo? --É a sociedade do ter, afirmava em tom condenatório. Todos
gastando o salário, o décimo terceiro e talvez comprometendo salários
futuros. No olhar, não há generosidade, mas incontrolável ânsia de
comprar, para si, para outrem, vontade quase mecânica, uma obrigação
social.
José
foge daquela multidão. Entra numa rua, fica espremido entre camelôs,
oferecendo aos gritos suas mercadorias e transeuntes, pechinchando e
aproveitando as ofertas.
Pensa no Natal, nas festas que nunca teve...
Para diante de um bar, moços de gravatas, paletós vestindo cadeiras, gargalhadas, muita cerveja...
_______________________________________________________ Para citar este texto:
Cícero Harada - "Presente de Natal"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/index.php?secao=veritas&subsecao=cronicas&artigo=presente_natal&lang=bra
Online, 19/12/2011 às 16:06h
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